A ERA DA PIROPOLÍTICA ESTÁ CHEGANDO
Robert Steuckers
Fonte: THE ERA OF PYROPOLITICS IS COMING
Fonte: THE ERA OF PYROPOLITICS IS COMING
O
que os cientistas políticos querem dizer quando falam sobre
“piropolítica”? Há duas fontes a serem exploradas para entender o que
querem dizer; primeiro, é necessário investigar todo o mundo da teologia
política, incluindo o pensamento de Juan Donoso Cortés sobre o
liberalismo, o socialismo e o catolicismo (o último sendo visto como a
própria Tradição) e, é claro, deve-se estudar minuciosamente a tese
central de Carl Schmitt, que prova que todas as ideias políticas possuem
um fundo teológico; segundo, é necessário levar em consideração a
percepção de Schmitt da política mundial como uma batalha entre os
elementos básicos, como a Terra e a Água. A política real, chamada em
alemão genuíno como “das Politische”, é necessariamente atrelada à
Terra, continental, e o homem político que é realmente eficiente é um
tipo de geômetra romano que organiza o território sob sua jurisdição
simplesmente medindo-o.
Após
as duas derrotas alemãs, em 1918 e 1945, a Terra não é mais o elemento
central da política mundial, sendo substituída pela Água. Assim, nasce a
nova dialética subversiva e destruidora da “Land und Meer”, ou Terra e
Mar, em que a Água alcança a vitória no final. O diário de Schmitt,
“Glossarium”, editado postumamente, insiste com veemência nos efeitos
destruidores da “hidropolítica” norte-americana, vitoriosa e
conquistadora do mundo. “Pyros” significa “fogo” em grego e representa,
de acordo com Michael Marder (citado abaixo), mais um elemento básico,
combinando não só a idéia de uma chama voraz e ardente, mas também os
correspondentes “luz” e “calor”. Embora Schmitt reduza as possibilidades
da política a dois elementos (Terra e Água), isso não significa que o
Fogo ou o Ar não existam e não tenham um papel, mesmo que menos
perceptível.
“Fogo”,
portanto, significa diversos fenômenos: a força ardente da destruição
(encontrada em revoluções anti-tradicionais), a “luz-sem-calor” do
Iluminismo ou o calor da revolta silenciosa contra as instituições
não-tradicionais (abstratas) derivadas dos diversos corpos ideológicos
do Iluminismo do século 18.
Quando
não mais nenhum território virgem a ser conquistado (vide as ideias de
Toynbee) e, consequentemente, organizados de acordo com os princípios
bem terrestres dos geômetras romanos, a Terra, como elemento
estruturante da verdadeira política é gradualmente substituída não só
pela Água, mas também pelo Fogo. A Água, como o elemento emblemático do
liberalismo, especialmente do tipo Manchesterista, poder marítimo, ou
plutocrático, não conhece fronteiras claras ou uma pausa positiva
(aqueles que param no mar afundam e se afogam, diz Schimitt em seu
Glossarium). Não há mais um “ócio” (descanso frutífero, introspecção,
meditação) possível, apenas o “neg-ócio” (nervosismo febril de
atividades materialistas incessantes) sobrevive e cresce. Vivemos,
então, em sociedades nas quais apenas a aceleração incessante
(“Beschleunigung”) governa e cancela todas as tentativas sensatas de
desacelerar as coisas (o irmão de Ernst Jünger, Friedrich-Georg, foi o
maior teórico dessa “desaceleração” ou “Entschleunigung”, sendo o
verdadeiro pensamento ecológico uma tentativa confusa de trazer de volta
o elemento Terra à cena política mundial).
Não
obstante, mesmo sendo um elemento sujeito à dominação, a Terra não pode
simplesmente ser varrida, mas permanece silenciosa, como se estivesse
ferida e hibernando. As forças hidropolíticas, então, buscam de todas as
formas destruir de vez a resistente e tácita Terra e, logo, provocar
explosões no continente, isto é, mobilizar o Fogo como um coadjuvante,
um Fogo que elas mesmas não manipulam, mas deixam as forças mercenárias,
empregadas secretamente em países com uma abundância de jovens sem
emprego, para realizar o seu trabalho sujo. O ápice do poder marítimo e
aéreo pode ser observado com a destruição do Iraque de Saddam Hussein em
2003, sem a cumplicidade de aliados e estrangeiros (do eixo
Paris-Berlim-Moscou). A guerra contra o Iraque Baathista não resultou
numa completa vitória para os agressores neoconservadores. Os poderes
marítimos, como não são poderes terrestres, são relutantes em organizar
áreas ocupadas como os geômetras romanos faziam. Dessa forma, para
manter os países derrotados e destruídos em um estado de total
negligência, os poderes hidropolíticos mobilizam o elemento Fogo, isto
é, o terrorismo (com sua estratégia de explodir pessoas e prédios e seu
fanatismo religioso ardente – “ardente”, derivado do latim “ardere”, que
significa “queimar”). Os recorrentes ataques terroristas contra os
mercados públicos xiitas são as mais horrorosas ações nesse retorno da
violenta piropolítica. O mesmo padrão de violência totalmente destrutiva
será usado mais tarde na Líbia. Quando não há mais habilidades de
geômetra disponíveis e quando não há mais vontade de criar um novo
Estado para substituir o falido Estado anterior, vemos uma transição à
piropolítica. A elite militar baathista terrestre do antigo Iraque
também se voltou à piropolítica, criando parcialmente o Estado Islâmico,
que se espalhou pela vizinhança enquanto era, ao mesmo tempo, uma
revolta contra o caos gerado pela guerra neoconservadora de Bush e uma
manipulação das forças secretas hidro/thalassopolíticas de pôr fogo em
países indesejáveis e, consequentemente, espalhar o Fogo voraz,
terrorista e fanático nos territórios dos seus maiores competidores
(para a Europa como um porto de refugiados entre os quais se escondem
terroristas, para a Rússia, em que os territórios da Chechênia e do
Daguestão estão diretamente relacionados a grupos wahhabitas.)
A
piropolítica do Estado Islâmico tem um efeito colateral de
ridicularizar a característica de “luz-sem-calor” das ideologias
iluministas das elites eurocráticas. A Luz por si só cega e não produz
soluções genuínas para os novos problemas que foram induzidos pelo
inimigo disfarçado da hidro e da piropolítica. Uma ideologia política
determinada exclusivamente por uma luz cegante, tão vazia de sentimentos
“calorosos” de segurança, está, obviamente, fadada ao fracasso. Os
Estados europeus gradualmente se tornam Estados falidos, pois aderem a
ideologias de “luz-apenas”, sendo fracamente desafiados pelos
“calorosos” movimentos populistas, como são chamados. A Europa está
agora sofrendo uma agressão dupla de duas ameaças: uma dos sistemas
ideológicos da “luz-sem-calor” – levando ao que Ernst Jünger definia
como “pós-história”, e uma da piropolítica importada do mundo islâmico,
previamente incendiado por diversos fatores, entre os quais a total
destruição do Iraque de Saddam é o mais determinante. A piropolítica do
Estado Islâmico é, não obstante, um problema bem complexo: o seu
elemento religioso se rebela de forma selvagem contra a ideologia de
“luz-apenas”, super influente e globalmente dominante do Ocidente, e
promove uma piropolítica alternativa “baseada no calor”, exatamente como
um correspondente europeu também buscaria substituir os distúrbios
ideológicos antiquados e desoladores de “luz-apenas” com sistemas
políticos de coração mais aberto e mais calorosos. O avatar neoliberal
da ideologia de “luz-apenas” deve ser, portanto, substituído por uma
solidariedade “calorosa”, isto é, um socialismo que deve perder toda a
“frieza” que foi atribuída ao comunismo soviético ou francês por Kostas
Papaïoannou, uma voz autocrítica do comunismo durante os anos 60 e 70 na
França.
Mas
ainda há um aspecto selvagem, destrutivo e inflamável na piropolítica: a
chama ardente das explosões e das rajadas de metralhadoras (como em
Paris e Bruxelas) e algumas das execuções públicas por fogo na Síria
ocupada pelo Estado Islâmico, que visam causar medo na Europa através do
efeito de mídia que elas inevitavelmente possuem.
Ninguém
consegue aceitar uma rejeição radical e forte sem automaticamente negar
a si mesmo e o seu próprio direito de existir. O problema se torna
ainda mais agudo, já que todo o sistema criado pela ideologia de
“luz-sem-calor” (Habermas) não aceita a polêmica ideia do “inimigo”. Aos
olhos dos seguidores de Habermas, nunca há um inimigo; há apenas
colegas de discussão. Mas se os colegas se recusam a discutir, o que
acontece? Brigas se tornam inevitáveis. A elite dominante, assim como os
seguidores do raso e infantil Habermas, fica sem qualquer resposta para
o desafio. Terão de ser inevitavelmente substituídos. Este será o
difícil trabalho daqueles que sempre se lembraram dos ensinamentos de
Schmitt e Freund.
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